A enfermeira pegou a injeção de adrenalina:
-Rápido estamos perdendo a mãe!- disse o médico tentando manter a calma.
-Mas doutor a criança não está chorando!- exclamou a enfermeira em ataque de nervos.
-Dê-lhe um tapa na bunda!- afirmou o médico escutando um estampido forte no ouvido e logo depois um berreiro grande. - Eu falei pra dar-lhe um tapa, não para espancá-la!
-Mas ela esta viva oras!- enraiveceu-se a enfermeira.
O médico aplicou a injeção na mãe, e logo os batimentos voltaram ao normal, ele então enxugou o suor do rosto e terminou a operação.
Em frente à maternidade um homem loiro segurava aquela criança que não queria chorar, sua mãe havia acabado de sair da mesa cirúrgica há pouco tempo e agora estava dormindo. Aquele homem não era o pai, na verdade, a sua mulher estava dando a luz naquele instante a um menino, mas como o pai daquela criança ainda não havia chegado ao hospital, o jeito foi segura-la.
Virando o corredor, um homem moreno vinha mancando depressa com uma mamadeira com chá verde, este sim era o pai da criança que havia feito uma cirurgia há poucos meses. Ele passou direto pelo homem loiro, nem olhou, e foi direto para a maternidade procurar uma criança.
- Ei senhor!- gritou o homem loiro.
-Cara, num posso agora to procurando meu filho!
-Mas senhor...
-Já falei, estou procurando meu filho!
-Mas este é o seu filho!
-Não, este é o seu, o meu deve estar por ai!
-Não, este é o seu, o meu está nascendo!
-Não, esta criança não pode ser minha, criança feia demais, olhe como é o nariz dela é grande, suas orelhas são abertas como antenas parabólicas, não, não é minha esta criança!
A porta do quarto onde estava sua mulher se abriu, era o médico pegando na mão do homem moreno:
-Parabéns senhor Geraldo! É uma linda menina, parece muito com o senhor!
Geraldo pegou a menina nos braços, deu cutucadinhas no nariz dela e entrou no quarto, sua mulher estava na cama deitada, ele sentou na beirada da cama com o neném nos braços.
A mãe sorriu em meio a lágrimas vendo aquela menininha se alimentar de seu leite, chamou-a de Pallomah.
Criança franzina, quem não a conhecesse diria que era desnutrida, mas na verdade, era magra de ruim mesmo, porque comer era com ela. Cabelo de cor indefinida, digamos cor de mel, corte chanel e franjinha acima dos olhos espertos pra não dizer custosos. Sorriso sapeca, típico de criança que dá trabalho, no bochecha duas covinhas se fazia, rostinho bem definido, uma graça de menina se não fosse sua língua grande. Não havia quem escapasse da sua língua afiada.
-Pallomah beba esse leitinho com café!- disse avó Maria.
-Vó, este leite está azedo!
-Não está não comprei hoje.
-Vó, largue de ser boba, este leite está coalhando, não quero, só quero café!
E lá se ia a vó Maria pegar café para aquela pestinha.
Quando ainda pequena sofreu de uma doença no cérebro, causado por um trauma durante a gestação que causou problemas na formação do tubo nervoso central, tinha pequenas deficiências no corpo quase imperceptíveis, nada demais, teve disritmia cerebral e por isso era hiperativa.
Confesso que esta sou eu, Pallomah F. Silva, não conto o sobrenome do meio porque eu o odeio de morte, se pudesse já havia lhe enforcado e atropelado três vezes, mas como não é possível, deixo-o oculto até que ninguém se atreva a perguntar. Ferreira? Fontes? Ferraz? Furlan? Não. Fátima. E sem mais comentários!
De certo, acho que a vida quis divertir um pouco as pessoas, então eu nasci pelada, banguela, orelhas abertas, nariz grosso, e lá se vai cacetadas. Então nada tenho a perder!
Eu já fui criança levada, já fui Power rangers negro (porque rosa e amarelo já eram das minhas outras duas melhores amigas), como sempre fui a mais “pervertida” e mais macabra das três, era a Power rangers negra!
Lá se foi uma infância, três meninas. A primeira era de cabelos pretos compridos de pontinhas enroladas; a outra loira de cabelos cortados como de menino, gordinha e baixinha; e a última de cabelos cortados tipo Chanel, franjinha nos olhos, magrela e comprida. Eram três as quais nunca deixavam de brincar, a brincadeira é uma verdade, uma ilusão de que eram aquilo que eram para ser. E que fosse daquele modo, pois nada tinha de mentira, nada de sujeira, o mundo era um quintal!
Saudades...
(Continua... qualquer dia)
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