quarta-feira, 2 de março de 2011

Loucura

Era manhã de domingo e a missa acabara naquele instante, a praça antes vazia agora estava movimentada, cheia de fiéis se dirigindo a suas casas para fazer o tão bem elaborado almoço de domingo. Um homem de terno parecia que há dias não dormia direito, grandes olheiras e o cabelo todo bagunçado vinha saindo da missa quando passou em frente a um banco de praça onde uma senhora pelos seus cinqüenta anos de óculos escuros e bengala o parou:
-Senhor poderia me fazer companhia até minha carona chegar?
-Claro! –sentou-se e soltou um longo suspiro.
-Percebo que estás cansado, não andou dormindo por estes dias estou certa?
-A senhora é vidente? –ele sorriu.
-Não, tem coisas as quais não necessita dos olhos para se ver meu jovem! – ela tirou os óculos por um instante e mostrou-lhe seus estranhos olhos cinza.
-Deve ser terrível ser cega!
-Não é não, deve ser terrível não conseguir ver os caminhos corretos, as portas abertas da vida mesmo tendo olhos tão saudáveis quanto os seus!
-O que disse?
-O mesmo que você  conseguiu ouvir. Sei que estás triste, ouço sua respiração ofegante, o seu coração que bate tão tristonho, sua alma que parece sair de você a cada vez que abre sua boca.
-Estive passando por maus bucados senhora!
-Eu sei, eu sei. Pelo que percebo você veio buscar auxílio em Deus, mas antes você passou noites sem dormir e ingeriu muito álcool. Você buscou três soluções para o seu problema o qual não era de modo algum lutar contra eles, e imagino que depois da igreja você iria se matar. Não há sofrimento que justifique a morte, e sim a morte que justifica o sofrimento.
-Não sei o que fazer!-  ele começou a chorar.
-Até agora você apenas sentou e se lamentou da vida, mas não pensou em resolver seu problema.
-A vida nos impede, sempre! Acho que já estou louco com tudo isso.
-Posso te contar um segredo de como levo a vida? Lutando contra os sofrimentos, lutando contra a desordem em mim mesma?
-Sim.
-Saiba que a loucura não é a pior forma, a loucura é senão ausência de lucidez, ausência daquele senso moral que é estipulado pelo mundo sem ao menos nos consultar dos problemas. Então queira ser louco! Não meça as conseqüências de salvar-se, quer que a sua vida melhores? Corra atrás e esqueça-se do que os outros irão falar, esqueça a lucidez, esqueça o que o mundo diz. – ela se levantou e saiu a pequenos passos ainda dizendo. - Um terço de minha loucura eu guardo no peito, um terço na minha mente e um terço nos olhos. Guardo toda minha lucidez na cabeça, pois enquanto ela briga com um terço de minha loucura, os outros dois terços podem viver em paz! – ela parou em sua frente, e ele levantou os olhos, aquela velha senhora cega agora era uma moça que tinha seus olhos sãos. – Não, você não está louco, não ainda! Apenas está vendo coisas as quais não precisamos dos olhos pra ver. -  a moça então sumiu.

Naquele dia o homem foi até sua casa, procurou sua mulher e a abraçou. Foram-se horas de conversas a fio, foram lágrimas de dor pela perda do filho, foram largos sorrisos de esperança ao ver com a loucura que a vida não tinha acabado ali.

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